Resenha: “Rediscovering Robert Cox”

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BERRY, Craig. Rediscovering Robert Cox: agency and the ideational in critical IPE. Political Perspectives, CIP, v.1, n.8, 2007.

O texto em questão, de autoria de Craig Berry, se apresenta como uma reflexão sobre os limites e a contribuição da corrente neo-gramsciana das Relações Internacionais (RI) — referida como ramo crítico da Economia Política Internacional.

O autor levanta principalmente a questão de que essa escola de pensamento, apesar de receber influência do trabalho de Robert Cox, dele se distancia em direção a um materialismo, segundo o autor, menos compreensivo e mais influenciado pelo pensamento marxista. A leitura do que é um marxismo para o autor, porém, afirma que se trata de um pensamento de determinação material pura, onde as estruturas são predominantemente inflexíveis, em meio às quais os indivíduos são meramente coadjuvantes.

Em oposição a isto Berry coloca um Cox que, segundo o autor, se utiliza do “materialismo histórico” (p. 14-15) para construir uma leitura da conformação do sistema internacional a partir da noção de “estrutura histórica” (p. 13). Esta estrutura histórica é concebida como um palco de instituições e formas materiais sobre o qual os agentes atuam. Tal atuar seria marcado pelo que o autor chama de ideational factors, o que explica afirmando que:

Human beings have relationships with social, political and economic phenomena, and act upon them, by having ideas about them. Ideas, according to Cox, are important in two, idealized forms: first, as intersubjective understandings. Second, as agent-specific collective ideas, or political ideologies, which contain particular views of what in society is good, just, legitimate, natural, and so on. (p. 14).

Acreditamos que, o que o autor chama de ideational são o que compreendemos por representações — que inclui as concepções de ideologia, percepções e opiniões da realidade. Seriam as contradições entre os entendimentos intersubjetivos e as compreensões coletivas da realidade que levariam às mudanças estruturais. Segundo o autor, Cox defende que o conflito é a principal fonte de mudança estrutural, mas, de acordo com a exposição acima, a natureza deste conflito está fincada no plano das representações, no plano ideacional.

A questão principal aqui é saber até quanto esta concepção é realmente gramsciana — e, por extensão, marxiana — ou, por outro lado, caminha para se transformar em uma modalidade de idealismo.

Berry afirma que para Robert Cox as ideias não são determinadas pelas condições materiais e institucionais da sociedade, “ideas have bi-directional relationships with both material conditions and institucions;” (p. 13), ou seja, haveria algum tipo de co-constituição entre matéria, ideia e instituição. Mas a exposição de Berry leva-nos a perceber que, apesar de defender uma noção de indeterminação — ou melhor, de determinação complexa —, ao alocar o fator de mudança estrutural nas contradições entre as representações ideacionais individuais e coletivas, Cox se aproxima muito mais da teoria histórica hegeliana do que propriamente daquela que emerge da interpretação dos trabalhos de Marx e Gramsci.

Dito de outra forma, o Cox de Berry toma o conceito de ideia em Hegel e o batiza de outra forma, para então colocar nas contradições que existem no plano das representações a dinâmica das mudanças históricas. Mas, de fato, o campo das representações em Cox parece-nos o plano da ideia absoluta de Hegel.

Desta forma, a apropriação das concepções de Gramsci por Cox se mostra meramente instrumental: acrescenta “hegemonia” (p. 15) para explicar que existem países dominantes no plano do sistema internacional; usa “sociedade civil” (p. 15) para contrapor a noção de Estado — mas concebe como entidades apartadas, e não organicamente imbricadas como no trabalho do militante italiano.

A articulação de Vico e Marx realizada por Cox, da qual nos relata Craig Berry, parece de fato curiosa (para dizer o mínimo): se Robert Cox realmente realiza tal agenda, mistura concepções históricas e de conhecimento tão completamente estranhas entre si que nos faz questionar a real abrangência, ou fidelidade, de seu conhecimento acerca dos autores que emprega.

Assim, a crítica ao pensamento neo-gramsciano de que são muito materialistas, e por conta disto se afastam de Cox, procede exatamente porque o Cox do qual nos fala Berry se apresenta como um idealista hegeliano: para ele é o plano intersubjetivo que subordina e determina o material e suas mudanças. Cox, concordamos com o autor, não é um neo-gramsciano, sequer um gramsciano, muito menos um marxista, mas sim um hegeliano; seu esforço é, portanto, o de construir um realismo idealista. E como isto é naturalmente anacrônico, Robert Cox parece incorporar autores “materialistas” para conferir alguma noção de realismo em sua análise.


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