Fonte: Cristaldo (2022), a partir dos trabalhos de Kosic, Tragtemberg, Bakhtin, Mészáros, Faria, Paço Cunha, entre outros.*
A partir desse modelo, se procura representar o campo da administração (ADM) e dos estudos organizacionais (EOR).
Muito embora haja controvérsia sobre a relação entre ADM e EOR, nesta representação ambos são articulados, formando uma totalidade. Aparentemente a gestão se confunde com o campo da Administração, enquanto quê a organização seria o campo dos Estudos Organizacionais. Mas essa divisão, na nossa interpretação, é ilusória dado que ADM e EOR formam um espaço comum, integrado, dialógico e dialético.
No modelo se procura representar a relação entre aparências (fenômenos) e essências (coisas-em-si) dispondo uma linha tracejada que representa o limiar da pseudoconcreticidade. “Gestão” e “Organização” são fenômenos, cujas características são captadas pelos sentidos de forma quase automática, imediatamente. Porém, são na verdade manifestações aparentes de relações sociais que, para ser percebidas, precisam, como afirma o filósofo Karel Kosic, não apenas de um esforço, mas de um detour, de um “desvio de olhar”.
A essência, a “coisa em si” da gestão são os processos de hierarquização e especialização do trabalho, a divisão técnica do trabalho. O que aparece aos olhos imediatamente são um conjunto de técnicas, como o planejamento, BSC, PDCA, o PMBOK. Estes se apresentam como construtos racionais com descrições pretensamente universalizantes e axiologicamente neutras. Mas escondem o fato de que: (i) a gestão é um mecanismo de operacionalização da exploração do trabalho e da extração de mais-valor, cujo o objetivo final sempre é o de controlar as ações das pessoas, ou seja, não são neutras; (ii) seus processos de aprimoramento seguem as tensões, lutas e interesses de classe num contexto histórico em particular e, portanto, não são universais.
Já a “coisa em si” que aparece na organização, por sua vez, são as relações entre as classes sociais, a divisão social do trabalho. O olhar apressado enxerga um corpo funcional composto por pessoas e fatores de produção, um tipo de instituição social, que funcionaria como um microcosmo de regras (símbolos, linguagens, manifestações culturais) sociais próprias. Mas, essa percepção esconde o fato de que a organização é, na verdade, um instrumento de mediação entre capital e trabalho. Assim, os capitalistas não têm que explorar diretamente os trabalhadores, pois existe uma estrutura de heurísticas e procedimentos, formada e mantida pelos próprios trabalhadores, para exercer essa função.
Os diferentes conectores representam também diferentes formas de relação.
A relação entre os fenômenos (gestão e organização) e suas respectivas coisas-em-si (divisões técnica e social do trabalho) é dialética, haja vista o fato de que a conceituação das primeiras se encontram vinculadas ontologicamente às segundas. Cada par forma uma totalidade dialética. O fenômeno não é uma mentira, assim como a coisa-em-si não é A Verdade. De fato, aparência e essência compõem uma totalidade concreta necessária, cujo entendimento não é a soma da descrição das partes, mas a compreensão de sua formas de entrelaçamento e dinâmica.
Gestão e organização, por sua vez, mantém relação dialógica; são significado e significante uma da outra, na medida em que sua compreensão está vinculada no plano perceptual. Da mesma forma, a “hierarquização e especialização do trabalho” está em relação dialógica com as “relações entre classes sociais”. Ou seja, formam totalidades vinculadas, não-necessárias, no plano dos signos, num entrelaçamento de ordem semiológica.
Por isso é lícito dizer que a administração/estudos organizacionais é uma ciência histórica, pois a gestão e as organizações mudam de forma, se complexificam, aprimoram, ganham diferentes ênfases ou sentidos, a medida em que as condições materiais das relações entre classes e as formas de controle se modificam por conta da fricção de seus interesses irreconciliáveis.
Assim, portanto, o campo da ADM/EOR é a totalidade dialética/dialógica formada pelo quadrunvirato composto por (i) gestão, (ii) organização, (iii) divisão técnica do trabalho e (iv) divisão social do trabalho.

* Embora o rol de referências consultadas para elaboração desse trabalho tenham servido de base e inspiração, assumo total responsabilidade pelas afirmações desse modelo e de sua explicação, bem como do artigo no qual se fundamenta.
Referências
CRISTALDO, R. C. Sobre o campo de saber da administração: gestão, organizações e divisão do trabalho. Revista Gestão e Conexões (REGEC), v. 11, n. 1, p. 103-124, jan./abr. 2022. Disponível em: https://doi.org/10.47456/regec.2317-5087.2022.11.1.36090.104-124. Acesso em: 28 jan. 2022.
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